por Tanmara Gomes
O olhar artístico do campinense Gleydson Virgulino vem desde a infância. Marcado pelas festas de carnaval de rua, encontrou nesse recinto a liberdade de viver, sentir e criar arte. Caminha deixando um rastro extenso de tudo que o compõe como produtor cultural, buscando explorar os elementos da cultura paraibana. Por isso, a pluralidade que carrega pode ser compreendida como uma extensão de suas vivências.
Florescendo no Sertão
No campus da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), em Cajazeiras (PB), se formou em Letras, com habilitação em Língua Portuguesa. Não se encontrou no curso, mas o mesmo não se pode dizer quanto a cidade. No Sertão, fez suas primeiras produções culturais, além de experimentações em festas como DJ. Entrou para o Coletivo Maria Fumaça e daí em diante, não deixou essa sua "nova" faceta escapar. Ao mesmo tempo em que Gleydson se torna filho do Sertão, também adota para si o produzir artístico.
Cangerê
Quando regressou para Campina Grande, não sabia exatamente como produzir de forma independente. Mas isso não foi suficiente para aplacar sua necessidade de criação. A escolha do nome Cangerê, pertencente à religião afro-brasileira, veio do hábito de pronunciá-lo nas rodinhas de conversa com os amigos. Gleydson não tinha dimensão de seu inteiro significado, mesmo assim, sabia da força daquela palavra e se apegou a isso para formar algo novo.
Seu desejo era nomear o movimento artístico que queria inserir na cidade, então o Cangerê (com "g" mesmo) toma forma em 2018 com sua primeira ocupação. Um bailinho tropical, realizado às margens do Açude Velho, com direito a decoração, muita música e comidas típicas do Nordeste, além de uma feira colaborativa.
A partir disso, as ocupações ficaram mais recorrentes, principalmente durante o carnaval. O bloco "Sereias do Açude Velho" foi atração principal em 2020, reunindo centenas de pessoas no movimento carnavalesco.
Esse olhar para o carnaval de rua foi cultivado pelo produtor ao enxergar sua banalização por parte das entidades que promovem o evento nesse período.
Em entrevista ao Campina Cultural, fala da insatisfação de perceber a descaracterização das manifestações populares, sua negação, e por vezes, a censura oculta, citando como exemplo o nome "Carnaval da Paz" que, para ele, transmite uma clara mensagem, como se existisse o outro lado da festa, imposto como ruim e sem credibilidade.
Desse descontentamento, nasce então a crítica ao termo. Através de sua caracterização como papangu (figura tradicional dos reisados, representados por suas cores), vestido de preto, Gleydson saiu nas ruas durante o carnaval, representando o apagamento e a ocultação da cultura popular.
Amarelo Manga e identidade audiovisual
Entre suas inspirações, o produtor cultural cita o filme Amarelo Manga, do diretor Cláudio Assis, como um marco para questionar assuntos como a sensibilidade humana e o olhar sobre o periférico.
"Foi uma ação muito forte pra mim, de alguma forma me conduziu pra esse lugar que eu pertenço. Com meu corpo, como um negro, como gay… Ele me despertou um entendimento muito grande das coisas", comenta sobre o filme.
Também menciona que sempre foi mais interessado pelas coisas que ficam longe dos grandes centros. Destacando os corpos, as histórias, as cores, as vivências e a falta de predominância do dito padrão.
No último ano, se dedicou a pesquisar de perto a cultura popular que tem sido desenvolvida atualmente em Campina Grande. Por estar próximo dessas manifestações culturais, promoveu uma exposição de registros fotográficos e uma vídeo performance chamada "Bandeira Branca". A produção foi exposta no perfil do Instagram do produtor, que diz usar esse espaço como sua galeria.
Participou da 5° Edição do Curta Caicó, no Rio Grande do Norte. Ele relata que não tinha muita pretensão quanto ao ramo do audiovisual, mas abraçou a proposta há mais de um ano e tem auxiliado em produções e eventos que dão visibilidade às produções nordestinas, como o faz no Cine Açude Grande, em Cajazeiras, na Mostra Sumé de Cinema e no Festival Muído, de Campina Grande.
Para depois
Entre tantas experiências de aprendizado e oportunidades de selar futuras parcerias, Gleydson nos adianta que está preparando uma ação do Cangerê, momento em que um objeto da marca será lançado, com foco na discussão sobre Brasil e suas brasilidades.
Através da produtora e de outras ações, ele espera ramificar o desejo de dar atenção ao popular, de forma que tal urgência ecoe para outros lugares, levantando outros questionamentos e abrindo mais espaço para os inviabilizados. A intenção segue sendo a busca por tornar possível viver de sua profissão e possibilitar o mesmo para outros artistas.
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Texto: Tanmara Gomes
Entrevista e Produção: Tanmara Gomes e Felipe José
Editor de Texto: Eduardo Gomes
Editora-Chefe: Ada Guedes
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